Hunger
(2008)
Primeira parte: Irlanda do Norte, 1976-81. Um agente penitenciário britânico sai de casa para o trabalho, verifica se há uma bomba instalada no chassi do seu carro, o liga e sente alívio por um segundo. Cena seguinte: Penitenciária Maze, ao sul de Belfast. Seguinte: Terroristas sentenciados do IRA se recusam a usar uniformes de presos comuns, a tomar banho e inundam as suas celas de urina e excrementos. Seguinte: Voz de Margareth Thatcher discursando, basicamente, que terroristas são criminosos, e não merecem tratamento especial como sentenciados políticos. E: dois terroristas recebem mensagens partidárias durante a visita de suas namoradas ou esposas. Por fim: os sentenciados são removidos de suas celas nojentas, têm os cabelos cortados e são lavados, tudo à força, óbvio. Bobby Sands começa a destruir a sua cela, acompanhado na ação pelos demais presos das outras celas.
Segunda parte: Um padre militante debate com Bobby Sands, por mais de vinte minutos, os rumos que este está tomando.
Terceira parte: Agonia e morte de Sands.
Sobre como conheci Bobby Sands: Em 1981 eu tinha dezesseis anos, ainda era católico e tinha uma vaga noção do que era o IRA. Quando soube que jovens católicos estavam fazendo uma greve de fome contra o repugnante governo de Margareth Thatcher, a coisa me pareceu algo de heróis abnegados lutando por sua pátria católica contra os ingleses imperialistas protestantes. Mas não era bem assim... Pouco tempo depois, aqui no Brasil, meia dúzia de estudantes da UFJF entraram em greve de fome (por quantas horas, mesmo?!) devido a um aumento da refeição do R.U. Eu pensei: é, não é bem assim. Bobby Sands sobreviveu por espantosos 66 dias, muito acima do imaginável, talvez o discurso dele quisesse morrer, mas o corpo lutou muito para ficar vivo.
Sobre o filme: Quando eu vi Shame não atentei para o nome do diretor. Mas tenho visto elogios rasgados a Steve McQueen (n. 1969), e pensei se tratar de algum diretor com vasta e consagrada filmografia, e, eu, mais uma vez, por fora das coisas. Pesquisando, verifiquei este Hunger, premiado e respeitado em trinta países. É um filmaço, em dois grandes aspectos: a fotografia, o tratamento da percepção visual, o uso do som; e a extração de emoções, o impacto das situações, é como se a humanidade explodisse para fora da pele de cada um, o alargamento de limites. É uma obra marcante. Mas há a adoção de algo inaceitável: Bobby Sands é tratado como uma vítima, um mártir, um homem de princípios. Eu perguntaria: foi sentenciado injustamente? Implicaram com ele, somente por ser irlandês e católico? O Reino Unido era um estado totalitário? O crime por ele cometido foi de menor potencial ofensivo? Por que o diretor silencia sobre o passado do herói?
A melhor cena do filme na minha opinião é o debate entre o padre e Sands, uma tour de force para a memória e talento dos atores Michael Fassbender e Liam Cunningham. Mas a palavra final vitoriosa é de Sands, a preferência do diretor é clara.
Sobre heróis: Em 1989, na turnê do U2 nos EUA, Bono Vox fez esta afirmativa em um show, exibido em Rattle and Hum: "muitos falam sobre a glória de morrer pela revolução, mas por que ninguém fala da glória de matar pela revolução?". Achei o discurso conveniente para a plateia estadunidense, mas lhe dei razão. Esta semana, por coincidência, falei aos alunos de uma turma joinha, com a qual conversava humoradamente: "Gente, todo terrorista é um louco". Eles ficaram meio que assustados, como se o terrorista fosse eu. Assim como a personagem de Bruno Ganz em Complexo Baader Meinhof, assim como a personagem de Yves Montand em I comme Icare, eu fico um tanto frustrado com o fato de que parte substancial da humanidade tenha simpatia pela ação violenta.
Sobre jovens que querem morrer por ideais: Fico abismado e me perguntando porque a juventude universitária de hoje, com tanta educação, tanta mesada, tanta festa, tanta droga, tanta balada, tanta moda, tanta música, tanto cinema, tanta informática, tanto celular, facebook, msn, instagram, ipod, ipad, iphone, ai, meu Deus, fique escrevendo textos sobre caras que "morreram por seus ideais", não é melhor viver por eles? Será que esta meninada tão burguesa e mimada encararia uma empreitada destas, quantas horas suportariam sem o seu sanduíche preferido, em uma prisão deprimente, exercitando a própria loucura? Ah, como diz uma amiga minha: "Poupem-me".
esse eu tenho q respirar fundo pra tentar ver. beijos, pedrita
ResponderExcluirÉ impactante, mas vale bem a pena. Apesar de tudo o que eu disse, é um filme e tanto.
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