Juiz de Fora

quarta-feira, 27 de março de 2013

O Panótico vê aqui e agora (315)


Um alguém apaixonado
(2012)


Akiko é uma jovem do interior, criada pela avó, que vai para Tóquio tentar crescer na vida. Garota de programa do tipo padrão nipônica: lolitinha ingênua e sapeca, cursa Ciências Sociais em uma faculdade. O seu namorado é um jovem de periferia, um mecânico que largou os estudos na adolescência, inferiorizado, impulsivo, possessivo e valentão, e que não sabe no que a moça está envolvida. Na cena inicial, o patrão de Akiko a pressiona a atender um cliente especial, e a moça caindo de sono vai ao seu encontro contrariada. Pelo caminho, em um táxi, Akiko vê a sua pobre avó sentada em uma praça na vã esperança de que a neta atenda aos seus muitos telefonemas para vê-la. 

O tal cliente é Watanabe, um septuagenário professor universitário de Sociologia, escritor e tradutor, reconhecido e respeitado por colegas, editores e ex-alunos.



Akiko se depara com o universo do simpático professor, livros para todo o lado, em um aconchegante apartamento do solitário viúvo. Akiko pergunta-lhe por que não vende, queima ou joga fora os livros que já leu. O intelectual fica fascinado com a figura ignorante, meiga e tola da jovem, particularmente em uma cena em que ela se despe da capa de inverno e exibe um vestidinho amarelo do tipo, eeeh..., lolitinha ingênua e sapeca.




Watanabe e Akiko assumem posições de uma farsa, ele banca o avô protetor, e ela a neta que quer proteção, mas é óbvio que as forças primordiais por detrás da encenação são outras. O namorado valentão acredita no idoso e também encena outro papel, o do Romeu que quer se casar com a benção da família da noiva. Vai dar m....

Gostei demais deste novo filme do diretor iraniano Abbas Kiarostami, diretor dos ótimos Através das Oliveiras (1994), O balão branco (1995), Dez (2002) e Cópia Conforme (2010). Os diálogos em estilo realista/naturalista são ótimos. As muitas locações nesta cidade fantástica que é Tóquio me fazem lembrar de Encontros e Desencontros, de Sofia Coppola. Muitas das falas não são filmadas, apenas observamos a reação dos seus destinatários. As expressões faciais dos atores, dentro daquele universo contido dos japoneses, valorizam as sutilezas, a compreensão mais profunda da alma humana. 

É uma combinação de Lolita e O anjo azul: o intelectual vivido, com um lugar no mundo, que vê o seu quotidiano produtivo e metódico ser modificado por personagens que ele compreende sociologicamente, mas não é capaz de se sobrepor a eles. A prostituta miolo mole, que finge não saber por que busca a proteção de dois heróis falíveis, o jovem viril, mas estúpido, e o velho sábio, mas sexualmente irrelevante.

A força-bruta da classe operária, que finge desprezar a formação educacional, mas se curva diante de uma autoridade que lhe parece superior.

Isto sem falar na ótima trilha que combina o melhor do jazz (Blakey, Coltrane, Powell, Baker, Dolphy e muitos outros) com Bjork.

Recomendo vivamente, amanhã eu vejo mais uma vez.

domingo, 24 de março de 2013

O Panótico vê aqui e agora (314)



Cinema Verite
(2011)


Em 1971 o produtor de tv Craig Gilbert (James Gandolfini) realizou o primeiro reality show que se tem notícia, o An American family, exibido dois anos depois. Câmeras filmaram durante boa parte do dia os Loud, uma família alta classe média de Santa Barbara (Califórnia). O pai empreiteiro, Bill, (Tim Robbins), a mãe dona-de-casa, Pat, (Diane Lane) e cinco filhos entre treze e vinte anos. Aparentemente era uma típica família americana unida, branca e bem de vida.



No início tudo parece harmonioso. O pai está sempre feliz com o próprio sucesso profissional e a mãe orgulhosa do casamento e de seus filhos, particularmente do primogênito Lance, que vai para Nova York tentar a vida como ator de teatro. Os dois rapazes do meio querem tocar numa banda, e as caçulas são adolescentes normais. Mas, com o desenrolar do filme, os problemas se vão evidenciando: o pai é infiel, os filhos não querem nada com trabalho, o primogênito enfrenta a contrariedade paterna por ser gay, a esposa se queixa de solidão, da ausência prolongada do marido - a princípio viajando a negócios -, e está sempre com um copo na mão. Paralelamente, o produtor a incentiva a se tornar mais atraente diante das telas.

O centro do filme é Diane Lane, que, não sei por que cargas d'água, é exibida como uma mulher madura e sensual, mas está bem envelhecida, nem parece que se trata de um filme estadunidense. O melhor ator é disparado Tim Robbins, ele até alterou a dicção para falar como o pai novo-rico. Interessante são as cenas com a verdadeira família, os atores são parecidos fisicamente com eles, mas a caipirice da família é indisfarçável, você vê, pelas expressões, pela voz, pelos cortes de cabelo, pelos maneirismos, pelas sardas, pela boca-aberta, rs...


terça-feira, 19 de março de 2013

O Panótico vê aqui e agora (313)


César deve morrer
(2012)

Em um presídio italiano de segurança máxima detentos condenados a longas penas ou mesmo à prisão perpétua por homicídio, narcotráfico, e sequestro ensaiam e encenam Julio César de Shakespeare.

Ai, ai, ai, que frustração. Uma alegoria iluminista primária dos irmãos Taviani, com atores brucutus, brutalizados, sem talento (com exceção do que faz Marco Antônio, ao meu ver), tudo isto para que plateia integrada e arrependidos finjam que não são o que são. Tudo me cheirou a pastiche, hipocrisia, bom-mocismo, lento e aborrecido.

Os irmãos Taviani nunca me arrebataram com seus filmes, mas eram ou são sempre filmes de qualidade. Recordo-me que gostei bem de A noite de São Lourenço, um filme de '82 que assisti quando tive o meu primeiro videocassette, alguns anos depois. Recordo-me também de Kaos.

Achei patético a simpatia gratuita da plateia para com os criminosos, seriam menos humanistas se fossem parentes de suas vítimas.

domingo, 17 de março de 2013

O Panótico ouve aqui e agora (111)



Anvil Machine
(Anvil FX)



Anvil FX é o músico Paulo Beto e o dj Pedro Zopelar. As composições são de Paulo Beto, natural de Juiz de Fora e residente em São Paulo há mais de vinte anos. Com farto conhecimento de música eletrônica (se quer saber muito sobre música eletrônica recomendo o seu extinto blog : http://mundoestranhodepb.blogspot.com.br/), e muito talentoso, Anvil FX é uma de suas bandas. Anvil Machine é o terceiro trabalho de Paulo Beto como Anvil FX, acredito. 

Paulo Beto é grande conhecedor de sintetizadores, tem dezenas deles, muitos dos quais raros e analógicos. Possui farta discoteca sobre música eletrônica e correlatos, e é reconhecido pela imprensa e público especializado, particularmente em São Paulo. Profissionalmente atua no ramo publicitário (jingles, com premiações e workshops no Brasil, EUA, Alemanha e Espanha)




Até onde posso compreender deste cd, ele é basicamente uma síntese semi-pop de influências diversas: compositores primordiais de eletrônica, alguma coisa de rock alemão dos setenta, filmes B dos sessenta e setenta, Cabaret Voltaire, Kraftwerk. Várias faixas me lembram os precursores do technopop brasileiro, os santistas do Harry, mas não sei se o Anvil FX tem esta banda como referência. Há alguns vocais femininos que me pareceram datados e desnecessários. Há uma temática meio ficção científica ou filme de horror B subjacente, a julgar pelos títulos. E também o sintetizador Anvil Machine especialmente construído para a gravação, conforme li em reportagem local. Não assimilei o cd por completo, mas gostei bastante da faixa-título e da quarta, Shinemartys (que me lembrou Pink Floyd, Tangerine Dream e Mike Oldfield).

Vinil a R$60,00 e cd a R$20,00.

O Panótico vê aqui e agora (312)


Antiviral
(2012)



Sid March é um jovem promotor de vendas da Lucas Clinic, muito convincente, e o seu produto é algo diferente. Ele vende infecções de astros para fãs. O fã vai até a sua clínica e escolhe o micro-organismo que vai lhe permitir desfrutar o prazer de conviver com os mesmos sintomas de seus ídolos. Sid March, no entanto, contrabandeia estes micro-organismos para o mercado negro, inoculando-os em si mesmo e isolando-os em seu laboratório particular. O desvio vai bem até que ele é infectado com um vírus desconhecido que pode lhe tirar a vida.




Eu não sei o que é mais irritante no mundo da fama: a celebridade ou o fã. As celebridades que acreditam que são deuses, ou os fãs que torram uma grana imensa e tomam decisões estúpidas por conta de seus ídolos. Eu realmente acredito que se tal empreendimento infectológico fosse legalmente viável haveria idotas aos borbotões que pagariam muito para ter uma gripezinha Lady Gaga, uma tossinha Ivete Sangalo e por aí vai.

Este filme canadense dirigido por Brandon Cronenberg, filho de David Cronenberg, incomodará ao grande público. Caleb Lendry Jones é um rosto e uma voz que pode prosperar. Muito branco, ruivo e sardento, meio andrógino, o rapaz tem um ar desolador convincente e nos deixa torcendo para que ele derrote o empreendimento ao seu redor. Mas o que leva a fazer tudo isto?

terça-feira, 12 de março de 2013

O Panótico vê aqui e agora (311)





Killer Joe
(2011)

Chris (Emile Hirsch) é um jovem texano traficante de drogas que teve a sua mercadoria furtada e vendida pela mãe - alcoólatra e viciada - e agora está devendo muita grana aos traficantes. Expulso de casa pela genitora, pede abrigo ao pai imbecil e maconheiro, que vive com a madrasta garçonete e um tanto vadia (logo de cara, na primeira cena, você verá que não estou exagerando), e tem a brilhante ideia de, em acordo com ambos e mais Dottie, a irmãzinha lolita e lelé, planejarem o homicídio da mãe e ex-esposa para dividirem um seguro de vida de cinquenta mil dólares. Para o crime perfeito contratam um detetive corrupto, o Killer Joe (Matthew McConaughey).



Filmes sobre famílias sempre prendem a atenção, seja as reprimidas e neuróticas do cinema do norte europeu ou asiático, sejam as famílias trapalhonas do tipo italiana ou latinoamericana, ou as famílias rednecks estadunidenses. Este filme é uma comédia, embora seja de um realismo impressionante sobre a miséria humana de cinco pessoas unidas por dinheiro sujo. A cena em que todos ceiam como uma autêntica família de pais-peregrinos protestantes é a que melhor condensa a hipocrisia dos EUA quanto ao tema. É um tapa na cara bem dado.

William Friedkin foi o diretor de O exorcista, não tenho nenhuma opinião sobre a carreira deste estadunidense septuagenário, a sua filmografia não me diz nada de espetacular. O protagonista Emile Hirsch é desconhecido para mim, e me parece o melhor ator do filme. Matthew McConaughey também não representa nada para mim, com uma carreira de quase vinte anos, e é a primeira vez que o vejo acima da média, embora um tanto caricato como o cara durão que tem calma para impor respeito.


Estava entre assistir este e Cesare deve morrer, dos irmãos Taviani. Como passei dois dias sem carro por conta de um defeito, queria relaxar e preferi esta comédia com cara de filme de Tarantino. E eu achei, mesmo, um filme bem Tarantino, com gente corrupta e incompetente, e diálogos esticados para impactar o espectador. Após o filme, ouvi o público (jovens e aposentados) falar que havia detestado o filme. Mas até chegarem a esta conclusão riram bastante e prestaram muita atenção.


Coincidência ou não, após cancelarem o cartão de fidelidade, o Alameda hoje vendeu os ingressos (quatro reais) com um saboroso brinde: uma barra de Kit Kat. Aprovado.

quinta-feira, 7 de março de 2013

O Panótico vê aqui e agora (310)




Barbara
(2012)




Alemanha Oriental, 1980. Barbara Wolf é uma médica que pede para deixar o seu país e por isto é transferida de um importante hospital de Berlim para um vilarejo no mar Báltico. Ela passa a ser supervisionada por Andre Reiser, seu chefe. Andre é pragmático, homem de confiança das autoridades, crê essencialmente nas premissas do regime, mas é capaz de dar à médica. pequenas brechas de liberdade.

Barbara namora um executivo da Alemanha Ocidental que prepara a sua fuga. Paralelamente, Barbara é assediada pro Andre, que vai lhe minando a resistência milimetricamente e estabelece uma genuína simpatia por Stella, uma paciente menor fugitiva de campos de correição juvenil.

Eu fiquei curioso sobre o que este filme iria dar, pois aquela coisa tipo "indivíduo-foge-do-totalitarismo-e-vem-para-o-MacPhisto" é muito hollywoodiano. Por outro lado, ninguém mais faz filmes em defesa do socialismo monopartidário, exceto talvez, na Coréia do Norte. Barbara é um filme realista, inteligente, a repressão do leste europeu não é caricata, a doutora só e importunada porque volta e meia escapole ao controle policial. É um filme lento, mas nada excessivo. Pode ser uma boa opção para se ver em casa, nada que compense ir a um cinema caro, distante e difícil de estacionar por perto.

Nas grandes capitais do mundo os cidadãos são incentivados a frequentar os cinemas por meio de generosos descontos. Assim, por exemplo, em Paris, pelo valor de duas entradas você tem acesso irrestrito aos cinemas durante um mês inteiro.

Aqui a rede proprietária dos cines Alameda cancelou os cartões fidelidade, que davam uma sessão gratuita a cada dez entradas.

terça-feira, 5 de março de 2013

O Panótico vê aqui e agora (309)



Hitchcock
(2012)

Hollywood, 1959. O diretor inglês Alfred Hitchcock estreia o seu filme Intriga Internacional, um grande sucesso com Cary Grant. O mestre de suspense completa sessenta anos de idade, já fez mais de quarenta filmes e um jornalista lhe pergunta se não seria hora de se aposentar, ainda no auge. Hitchcock percebe que precisaria fazer o filme, e se interessa por um livro sobre um serial killer gay e obcecado pela mãe, assassino de dez vítimas em Wisconsin, no final da segunda guerra. Hitchcock vai filmar Psicose.

Este filme é sobre a luta para filmar o seu maior sucesso. Hitchcock (o muito talentoso Anthony Hopkins) é mostrado como alcoólatra, com muitas manias, babando por suas atrizes e um pouco ingrato com sua esposa Alma Reville (Helen Mirren, excelente como sempre), roteirista de seus filmes e pilar de sua estabilidade. Paralelamente, o diretor lida com os chefões de Hollywood, que dificultam bastante a produção de Psicose.

Hollywood filmar Hollywood é sempre suspeito, não tenho como aquilatar se os entreveros narrados foram hiperdimensionados para dar ao público algo que prestar atenção. A análise psicológica das personagens e do tema do filme é palatável para o grande público. Não é um filme para cinéfilos. (E mais uma vez Scarlett Johanson foi contratada apenas para ser enfeite).

sexta-feira, 1 de março de 2013

My best loved 1973 rock albums (3)




Tales from Topographic Oceans
(Yes)






Tales from Topographic Oceans é o sexto álbum de estúdio do grupo inglês de rock progressivo Yes. É um álbum duplo com quatro faixas de cerca de vinte minutos. É a sua criação mais polêmica, mas eu nunca tive dúvidas sobre a excelência desta obra. Idealizado pelo vocalista Jon Anderson e pelo guitarrista virtuose Steve Howe, baseia-se na obra autobiográfica de um yogi hindu. Não sei quem é esse yogi e nunca dei muita pelota para isto. Ouvi-o pela primeira na casa de um amigo em São José de Campos, na única vez que fui à São Paulo, há trinta anos atrás.




A edição nacional tinha gravação pobre e ilustrações a preto-e-branco, mas a capa de Roger Dean, as letras de Anderson e Howe e os minutos iniciais de The reveiling science of God me deixaram com a rápida e depois permanente impressão de que se tratava do disco em que a banda mais investiu na sua visão de mundo, a mais espiritualista e hippie das bandas de rock progressivo de que gostei.




As segunda e terceira faixas do álbum, The remenbering e The ancient são claramente uma prova de que os artistas dispunham de um elevado nível de autonomia para lançar discos, pois elas não possuem qualquer atrativo popular visível, e mesmo muitos fãs de progressivo e da banda não as colocam entre as suas preferidas.





Mas a última, The ritual, foi um hit certo para os fãs do grupo, o refrão Nous sommes du soleil é bem conhecido (e reconhecido). O tecladista Rick Wakeman ficou meio de fora neste projeto, embora bem em destaque no resultado, impensável sem o seu talento como tecladista, e resolveu pular fora do grupo para iniciar a sua muito bem sucedida carreira solo por um biênio.





Acho que é um disco difícil para a maioria das pessoas. Durante anos eu tive o hábito de ouvir apenas a primeira e a última faixa. Hoje, não. Quanto às letras, já as li algumas vezes, mas o forte do rock para mim são as melodias. O trecho de "getting over overhanging trees" sempre me empolga e tenho com ele forte relação afetiva.













My best loved 1983 rock albums (3)




Genesis

Genesis é o décimo-terceiro álbum do Genesis, o sexto com o baterista Phil Collins nos vocais, e o terceiro em que a banda estava assumidamente fazendo um som bem pop. Após Abacab (1981), fiquei com receio de que o Genesis se descaracterizasse por completo, e o rock progressivo da banda fosse coisa do passado glorioso. A minha esperança, no entanto, era o tecladista Tony Banks, eu estava certo de que ele não deixaria de lado o seu papel crucial no grupo.

E não deu outra, assim que o disco em vinil saiu no Brasil o comprei, embora reticente com a capa infantil e a ausência de título no vinil. Mal começa a tocar Mama, faixa pelo qual os ouvintes apelidaram este lançamento, senti que havia uma procura de conciliar músicas de sucesso com melodias de qualidade. 

As minhas preferidas são Home by the Sea e Second Home by the Sea. Para mim, que o grupo sobrevivesse e faturasse eram necessidades da vida, contanto que não se tornasse apenas uma banda de apoio às canções melosas de Phil Collins.