Juiz de Fora

sexta-feira, 15 de abril de 2011

O Panótico lê aqui e agora (14)


A alma encantadora das ruas
(João do Rio/1907)

Até o início deste ano eu nunca tinha ouvido falar de João do Rio, e fui notar a sua importância procurando referências literárias para o meu mestrado. Paulo Barreto (1881-1921) adotou o pseudônimo de João do Rio na época em que escreveu crônicas na imprensa carioca (1904-07) que deram origem à esta obra, agora reconhecida à ponto de constar como leitura obrigatória em vestibulares e seleções de mestrado em literatura. Bom, pelo menos estes exames obrigam os candidatos a ler o que vale a pena.

João do Rio foi barrado para o serviço diplomático por ninguém menos que o Barão do Rio Branco que expressamente o vetou por ser "gordo, mulato e homossexual, o que não combina com o perfil do funcionário de carreira diplomática". Tempos duros...



O interesse desta obra é enorme, inclusive para a historiografia. João do Rio descreve com grande riqueza de detalhes os tipos populares que habitavam as ruas cariocas na época da reforma do prefeito Pereira Passos, que durante a presidência de Rodrigues Alves (1902-06) reformou o centro da capital federal, história já conhecida dos brasileiros.



Há um paradoxo evidente na obra de João do Rio: simultaneamente que demonstra um grande interesse pelas pessoas mais humildes e sofridas, chegando a frequentar os baixios do balneário, João do Rio faz questão de deixar claro que está acima deste mundo, não lhe pertence. É um excluído por ser afrobrasileiro e gay, o que lhe impõe certa simpatia a prostitutas, marinheiros, desempregados, mendigos, viciados em ópio, etc., mas sua origem de classe média e a condição de jornalista lhe dá suporte  para expressar comiseração pelo povo e alívio por não ter que suportar as suas dores.

RIO, João do. A alma encantadora das ruas. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. 253p.

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