Juiz de Fora

quarta-feira, 23 de março de 2011

O Panótico lê aqui e agora (10)


Toda vez que eu fico um pouco perplexo com alguma coisa eu resolvo buscar nas vidas alheias uma espécie de praia, ou pousada. É como se eu imaginasse que outras pessoas, que não eu, fossem mais capazes de levar a vida com maior sabedoria. Como eu não conheço tanta gente assim - na verdade, ao longo da semana, eu vejo indivíduos até demais para o meu gosto, algo em torno de duzentos, mas não é disto que estou a falar - eu busco socorro nos livros, principalmente naqueles que revelam muito sobre os seus autores. De onde vem a minha perplexidade? Passei por um processo de seleção de mestrado meio...esquisito, e, paralelamente a isto, esta foi uma semana em que os espaços blogueiros não estiveram muito a favor do confronto, na verdade é mais um contraste do que confronto, de ideias. Estou começando a ficar meio pessimista com este instrumento de comunicação. Mas, da tristeza se pode buscar algum consolo, e antes que o (a) leitor (a) se aborreça com este pensamento digno das piores novelas aí vão as minhas leituras atuais:



Um homem sem profissão
(Oswald de Andrade, 1953)

Adquiri este livro por uma providencial sugestão do mestre Felipe Fritiz, doutorando em Literatura (http://www.felipefritiz.blogspot.com/). Não sabia que Oswald (pronuncia-se Oswáld, segundo Antonio Candido, e não Ôswald) de Andrade havia escrito uma autobiografia. Eu adoro biografias, com ou sem auto. Há alguns anos atrás li Serafim Pontegrande, um exemplar enviado pelo MEC, um dentre muitas excelentes obras literárias que ficam empoeirando as estantes das escolas públicas, à espera de um leitor. Li tudo em uma noite que estava à espera de alunos. Achei sensacional.

De minha parte, a literatura brasileira me cativou em tenra idade. Já falei sobre isto aqui, há muito tempo. Durante a década de setenta, particularmente no governo Geisel, a esquerda militante no magistério aproveitou a riqueza das letras nacionais, particularmente o Modernismo, para tentar empurrar uma parte da classe média para o voto oposicionista, por meio da educação (bom, eu não sou ingênuo de achar que a esquerda realmente espera ou deseja que o jacques le bonhomme torne-se mais inteligente e culto do que é, governar sobre a incipiência é útil para qualquer tipo de facção política). O governo fingia que não pescava o que se passava no ensino, e deixou rolar à vontade o nacionalismo, o regionalismo, o inconformismo, etc. e tal dos autores brazucas. Daí que eu saí do fundamental já conhecendo de nome e de prosa e verso os principais autores da Brasilândia. Sorte a minha, porque o período em que cursei História não me incentivou a ler nada do que me indicavam. Os autores prestigiados pelo senso comum acadêmico me provocavam tal antipatia que, por exemplo, não li nada de Garcia Márquez e de Murilo Mendes. O reconhecimento maciço alheio, agregado a velhos discursos e chavões, me empurrava para ler autores de que ninguém gostava ou não sabia de sua existência. Com isto, perdi eu.

O que se dizia, ou qual era a imagem de Oswald de Andrade? O lugar-comum esquerdolóide era o seguinte: o homem era um representante da pequena burguesia, mas um proletário por vocação e ideologia, um garoto terrível que veio sacudir a pasmaceira dos barões do café, que no dizer de Claude Lévi-Strauss (1929): "fazem de tudo para parecerem europeus, mas não sabem como são tipicos".

E com que deparamos com esta autobiografia? Oswald de Andrade falando de seus caros quadros dos grandes mestres contemporâneos presentes em sua sala, do seu avô desembargador nomeado por Dom Pedro II, da origem feudal de sua família paterna que abafou uma revolta de escravos, e inúmeras descrições de uma família abastada. Neste país eu sei o seguinte: se você caiu no gosto de quem manda não tem pecado que não possa ser perdoado.

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