O livro do riso e do esquecimento
(Milan Kundera/1978)
Em 1985 eu li A insustentável leveza do ser do escritor boêmio (tcheco) Milan Kundera. O título se deve ao eterno retorno, noção de Nietzsche de que se a vida retornasse de forma circular e indefinidamente as ações individuais perderiam o seu "peso". Kundera se utilizou deste mito para refletir sobre a revolta boêmia contra o Sacro Império Romano-Germânico (1618) que impôs uma grave derrota ao país e levou-lhe à condição de nação submissa à austríacos, alemães e russos. Foi uma baita leitura e deu um filme muito bom, com Daniel Day Lewis, Juliette Binoche e Lena Olin.
Este livro do riso e do esquecimento tem por objeto consistentes reflexões sobre a Primavera de Praga e o domínio russo na antiga Tchecoslováquia, por meio de vários contos sobre pessoas reais, amigos e parentes do autor. Milan Kundera era jornalista, perdeu o emprego por força da invasão russa, assim como outros cento e mil tchecos também o perderam, e teve que fazer horóscopos para poder sobreviver. Depois não aguentou mais - assim como outros quinhentos mil também não aguentaram - e mudou-se para a França, onde vive até hoje. É uma leitura agradabilíssima, pelo menos para quem tem fascínio sobre o tema do totalitarismo, como é o meu caso (fascínio pelo tema, e repúdio pelo objeto, claro está).
As coisas, se privadas subitamente de seu suposto sentido, do lugar que lhes é destinado na ordem esperada das coisas (um marxista formado em Moscou acreditar em horóscopos), provocam em nós o riso. Em sua origem, o riso pertence ao domínio do diabo. Existe alguma coisa de mau (as coisas de repente se revelam diferentes daquilo que pareciam ser), mas existe nele também uma parte de alívio salutar (as coisas são mais leves do que pareciam, elas nos deixam viver mais livremente, deixam de nos oprimir sob sua austera seriedade) (p.76-7)
Nenhum comentário:
Postar um comentário