Juiz de Fora

sexta-feira, 29 de julho de 2011

quinta-feira, 14 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (130)


Inverno da Alma
(2010)



Ree Dolly é uma adolescente de dezessete anos que vive com a mãe portadora de transtornos psiquiátricos e dois irmãos menores, um de doze anos e uma de seis, em um subúrbio semi-rural de uma cidadezinha do Missouri, meio-oeste estadunidense. Pobre no sentido norteamericano (a casa possui certos recursos) e os vizinhos também pobres possuem pick-ups, Ree dá um duro danado porque o pai - Jessup - é um criminoso reincidente e encontra-se revel em outra ação penal em curso. Por uma sistemática diferente da nossa, Jessup, para ser solto sob fiança, contraiu um empréstimo e deu em garantia a própria casa. Não comparecendo á audiência judicial próxima, a residência da família será penhorada.




Este filme faz parte do cinema "realista": basicamente é um cinema que pretende retratar e fazer refletir sobre "as contradições do capitalismo", os atores são desconhecidos, não há qualquer "glamour" e os finais ou são inconclusos como a vida ou são infelizes (também como a vida). Claro está que não é muito comum em matéria de cinema estadunidense das últimas décadas.




A atriz que faz a protagonista é uma grande surpresa, e muito bom também o que faz o seu tio, irmão do criminoso, um sujeito alcoólatra e viciado em cocaína. Aqui a heroína não age por princípios, como no blockbuster padrão, mas a sua coragem e determinação de encontrar o pai fugitivo deve-se mais à necessidade de preservar a casa e impedir que a sua vida tornesse ainda mais miserável. Pensando bem, sim, ela age por princípios.




Impressionante é a plêiade de pessoas comuns: broncos, violentos, ignorantes, inconsequentes, é um festival de "feios, sujos e malvados" sem o tom cômico do realismo italiano. Paradoxalmente, a única personagem sensata deste universo de almas desencontradas é um sargento do exército estadunidense, responsável por recrutar fuzileiros navais entre estudantes do ensino médio, que desaconselha a pobre Ree a entrar para as armas apenas por dinheiro, e lhe sugere ficar em casa cuidando dos irmãos e da mãe inválida.



Um dos melhores filmes do ano passado.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (129)


Singularidades de uma rapariga loura
(2009)




Nunca assisti a um filme português e apenas li um ou dois posts em que era mencionado o cineasta Manoel de Oliveira. Tive a oportunidade de ver este filme e procurei não me informar a respeito para poder assisti-lo sem qualquer influência prévia.


Esta obra é uma adaptação de um conto de Eça de Queirós, provavelmente o maior escritor português dos últimos quatro séculos, conhecido de todos no Brasil devido às minisséries (ótimas)  O primo Basílio e Os Maias.

Não me recordava se havia lido este conto, mas o reconheci em linhas gerais: um jovem, em viagem de trem de Lisboa ao Algarve resolve desabafar á passageira ao lado "aquilo que não se conta à mulher e aos amigos, mas aos estranhos". Funcionário de uma loja de tecidos, e sobrinho de seu proprietário, o protagonista apaixona-se à primeira vista por uma moça casadoira, de família abastada, e enfrenta dificuldades para vencer as diferenças sociais entre ambos. A narrativa do filme me lembrou bastante as novelas do horário das seis, da tv Globo, quando eram adaptações de obras da literatura brasileira. Mas algo não desce, pois a trama desenrola-se nos dias atuais, e a despeito de muitas pessoas já terem me falado que os portugueses são mais reservados, mais discretos e tímidos na abordagem do sexo oposto, o filme resvala para uma caretice sem fim, perfeitamente adequada à época de origem, mas que exigiria um mínimo de correspondência aos dias atuais para que não caia no mais absurdo anacronismo.




Quando o jovem pediu "permissão" ao tio para se casar achei que era demais para mim.

terça-feira, 12 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (128)





Bravura Indômita
(2010)



Como o Bravura Indômita original não me agradou fiquei com receio de ver este remake. Mas os irmãos Coen não costumam decepcionar. O filme começa com narração em retrospectiva, a protagonista relembrando a própria adolescência, quando os fatos ocorreram, lá pelos idos de 1878, no sul confederado dos EUA. A adolescente aqui é ainda mais nova do que o original, apenas quatorze anos e tem um jeito semelhante ao das adolescentes da atualidade. O caçador de recompensas e agente federal Rooster recebeu um melhor tratamento, com o secundário ator Jeff Bridges fazendo a sua melhor interpretação de que tenho notícia. O coadjuvante La Boeuf está na pele de Matt Damon, que quase sempre faz o papel do bom rapaz, o Toni Ramos de Hollywood.



Fora isto, não há dúvidas de que a produção é muito maior, a fotografia é bela em diversas ocasiões, os irmãos Coen exploram mais a dramaticidade, e, para surpresa minha, aquela fragilidade e/ou sonseira que caracterizam os pobres mortais dos filmes dos Coen aparecem aqui de uma forma mitigada. Mais para drama do que propriamente um western, pode ser uma boa pedida. Melhor do que o original.

domingo, 10 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (127)



Um conto chinês
(2011)






Roberto (Ricardo Darin) é um comerciante de materiais de construção, meia-idade, que reside na periferia de Buenos Aires. Rabugento e misantropo, o filme explica o permanente mau-humor do protagonista por não ter ele conhecido a sua mãe, que faleceu quando era criança e por ter também perdido o pai na juventude. Roberto tem o hábito de colecionar notícias bizarras de jornal e gosta de ver os aviões decolando e aterrizando no aeroporto de Buenos Aires. Há também uma simpática moça interiorana que paquera Roberto, mas este tenta se esquivar dela.



Em um destes momentos de lazer ele vê um jovem chinês, Jun, ser jogado fora de um táxi. O chinês, que nada fala de espanhol, é socorrido por Roberto, e lhe exibe um endereço anotado no braço e lhe implora por ajuda. Roberto não tem outra alternativa a não ser  levar o estrangeiro, muito a contra-gosto, para sua casa, enquanto as autoridades policiais e consulares pouco fazem de concreto pelo oriental que está à procura de um tio residente sabe-se onde na Argentina. Roberto dá a Jun o prazo de um semana para encontrar o parente e sumir de sua vida.

O cinema argentino tem uma trajetória semelhante ao brasileiro, ao que parece. Levaram décadas para descobrir que o que faz um bom filme é, principalmente, contar uma boa estória. Diretores, atores, cenários, fotografia, podem ajudar, e muito. Mas sem um bom enredo a coisa não vai para frente.


Uma boa estória. Este filme é uma delas.

sábado, 9 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (126)


2046
(2004)







Este filme chinês de Wong Kar Wai me deixou confuso no início. Começa com ares de ficção científica: no futuro há uma extensa malha ferroviária que permitiria viajar no tempo, e as pessoas transitavam até o ano de 2046, um ano em que, sem uma explicação mínima, as pessoas poderiam revisitar seu passado. Um rapaz para este ano se desloca, mas retorna ao presente, contrariando a unanimidade geral. Mas esta é uma estória inserida no enredo principal, ambientado na Hong Kong de 1966, ano em que o escritor de 2046, na verdade um quarto de um hotel muquifo, apaixona-se, mas sem correspondência recíproca. Entendido isto, o filme é bem interessante, e eu gosto muito dos atores: Tony Leung (de Heroi), a suprema Gong Li e a querida de todos Ziyi Zhang. Fui saber agora que o filme é uma continuação de Days of being wild e In the mood of love. Acho que o melhor é começar pelo primeiro.

Meus Woody Allen preferidos



O novo filme de Woody Allen, Midnight in Paris, reacendeu o interesse geral pela sua obra cinematográfica. Há vários blogs publicando os seus preferidos. Aqui vai a minha lista, em ordem decrescente, estabelecida por meio de critério cem por cento subjetivo e sem resenhas porque daria um enorme trabalho analisar obra por obra. E aí, qual é a sua, caro(a) leitor(a)?

1 - Zelig
2 - Manhattan
3 - Annie Hall
4 - Radio Days
5 - A rosa púrpura do Cairo
6 - Hannah e suas irmãs
7 - Shadows and Fog
8 - Broadway Danny Rose
9 - Desconstruindo Harry
10 - Celebridades


Tenho observado que há quatro grandes grupos de opiniões sobre os filmes de Woody Allen: aqueles que gostam de tudo o que ele faz e ele representaria o máximo de complexidade que admitem ver em obras cinematográficas; os que preferem os filmes das décadas de setenta e oitenta e depois perderam o interesse no cineasta; os que preferem os filmes da década de oitenta (setenta, nem tanto), deixaram-lhe de lado por um tempo, mas gostam de sua fase europeia; os que consideram Woody Allen um artista "menor" e que só é bom quando se inspira (muito) em grandes nomes do cinema e da literatura, particularmente em Ingmar Bergman e nos clássicos russos do século XIX. Eu me incluo no terceiro (penúltimo) grupo.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (125)




71 fragmentos de uma cronologia do acaso
(1994)


Cheguei a este filme por indicação de um professor, a quem fico agradecido. Dirigido por Michael Haneke, o austríaco de A fita branca, é um filme meio James Joyce: são setenta e uma tomadas do quotidiano de quatro pessoas: um garoto romeno que foge de casa até a Hungria, depois para a Áustria e vai viver no metrô de Viena; um jovem profissional de tênis de mesa que vive sob pressão; um casal em crise; e um idoso que está sempre a falar pelo telefone com um familiar doente. Paralelamente, há cobertura televisiva sobre o Oriente Médio, na mesma linha editorial da DW TV que assistimos na transmissão paga.




Cada tomada é interrompida por um segundo, demarcando bem as mudanças de cena. Achei Viena, principalmente as repartições e edifícios públicos, idêntica às cinzentas cidades alemãs - não é porque a língua é a mesma que a paisagem urbana teria que ser similar. É um filme bem anos noventa, esta década lastimável, e a primeira ideia que vem à mente é a globalização. Se você viu o excelente Babel notará que são homólogos, embora este de Hanecke não traga uma explicação tão clara e sistematizada quanto o filme de Iñarritu. Gostei bastante.

O Panótico vê aqui e agora (124)


  Desconhecido
(2011)




Martin Harris (Liam Neeson) é um pesquisador estadunidense que vai até Berlim, juntamente com a esposa, se apresentar em um simpósio internacional. Ao pegar sozinho um táxi - dirigido pela atriz Diane Kruger, a fraulein Bridget von Hammersmark de Bastardos Inglórios - sofre um grave acidente, entra em coma por quatro dias e perde os seus documentos. Ao tentar localizar a esposa no hotel em que havia feito as suas reservas não é reconhecido pela própria mulher e há um outro Martin Harris assumindo plenamente a sua vida, inclusive com provas documentais e testemunhais.






O filme nos dá uma sensação de déja vu, mas é interessante porque envolve conspirações e você, como espectador, não é onisciente e divide a perplexidade com o protagonista. Diversão garantida sem dinheiro de volta. E quase me esquecia: Bruno Ganz (o Hitler de A queda) faz uma ponta. Eu gosto bastante desta "nova" safra de atores alemães da década passada.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (123)


Bravura Indômita
(1969)




Antes de analisar um clássico, - e dado este novo interesse pelo faroeste, coisa que parece acontecer uma vez a cada vinte anos -, devo fazer uma ressalva (ou várias): não curto o gênero western; western spaghetti para mim era um denotativo e não uma homenagem; não gosto de John Wayne e imaginava-o um universal canastrão, assim como Stallone, Norris e Schwarznegger; não sabia que faroestes serviam inclusive para metáforas filosóficas, obras sobre o limite do homem, e que tais. Dada a minha enorme ignorância sobre o tema, vou analisar de coração este filme, porque cinema para mim é antes de tudo um bom entretenimento e o Panoticum, conforme afirmei no primeiro post, tem mais a ver com o prazer que sinto em escrever do que a profundidade ou não do que digo.




Em um estado do sul dos EUA, há uns cento e trinta anos - com certeza após a Guerra de Secessão - um fazendeiro vai, acompanhado de um empregado, realizar um negócio no vizinho Texas. O empregado, alcoolizado, trai e mata o seu empregador. A filha de uns dezoito anos resolve contratar um desperado (John Wayne) para vingar a morte do pai. Outra personagem tem interesses também com Wayne, e os três rumam em direção ao possível paradeiro do criminoso.




A menina não demonstrou grande dor pela morte do pai, não se abala, e cuida da sua vingança num tom meio de moleca, tendo inclusive cabeça para propor joguinhos tipo pique-esconde com os outros dois protagonistas. A trilha sonora é de filmes "sessão da tarde". Wayne, bem, não lhe vejo carisma, talento, e ainda por cima um brucutu com a voz esganiçada. Robert Duvall e Dennis Hopper não salvam o filme. Vou ter que procurar outras obras mais significativas. 


T.V.Glotzer (27)


Happily Divorced
 (2011)



Fran Drescher é conhecida pela Nanny (1993-9), a cabelereira novaiorquina que queria casar com o rico patrão inglês viúvo e com três filhos adolescentes. Era uma minissérie novelinha, mas eu gostei bem, talvez um lado brega reprimido em mim e por mim. Fran era atraente, divertida, esperta, e a temática era socialmente liberal e democrática, bem ao meu gosto. Encerrada a série, ela protagonizou outra em que namorava jovens - Living with Fran (2005-6) -, eu vi algumas vezes mas não achei graça, o tema suzanavieira demais para o meu paladar.




Agora, ela com seus cinquenta e três anos, mais bonita que muitas com a metade de sua idade (eu sei que são plásticas e maquiagem) estreia esta série em que após um casamento de dezoito anos o marido se revela gay. Mas o marido, com a crise econômica estadunidense, não tem grana para alugar um apartamento e continua morando com a ex-exposa. Lógico que não vai dar certo e nós vamos rir muito. E fica assim: se o mulherio adorava Two and half men, uma série machista e sexista, eu posso gostar da comediante judia com a voz anasalada. Democracia não é só tolerância, é também aceitação.

domingo, 3 de julho de 2011

O Panótico vê aqui e agora (122)


Homens e deuses
(Des hommes et des dieux/2010)



"Eu vos digo: vocês são deuses, filhos do Altíssimo, todos vocês! Entretanto, vão morrer como os homens, como os príncipes, todos vocês tombarão!"

(Bíblia, Salmo 81)


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Eu já cansei de ver citações bíblicas artificiosas, fora do contexto, meramente exortativas, mas ao começar a ver este filme gelei com esta que você acabou de ler.



É muito bom quando começo a assistir um filme, ler um livro, ouvir um cd e a minha intuição me diz que vem coisa boa por aí.



Argélia, 1996, um pequeno mosteiro de monges trapistas. O cultivo da terra, o relacionamento amistoso, cordial, com os vizinhos muçulmanos, padres dedicados com serenidade, humildade e dignidade a princípios, nada de teatros de fé e pedofilias. Uma harmonia ritual entre o homem, a paisagem, o próximo. Poucos filmes que sensibilizam pela fé me fizeram lembrar de um tempo em que o catolicismo me parecia uma estação segura, uma vivência, mais do que uma utopia.




Próximo da localidade, trabalhadores croatas foram assassinados pelos fundamentalistas islâmicos - a guerra civil da Argélia, entre 1991 e 2002, iniciada após um golpe militar "preventivo" contra a vitória eleitoral dos grupos fundamentalistas. O exército oferece proteção aos monges, que é recusada. O filme pode ser visto como uma propaganda tendenciosa contra o fundamentalismo islâmico, mas não é esta a questão principal: qual é a glória de matar em nome da fé?